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Uma pessoa deveria ter o direito de se isolar sem ser rotulada de “estranha”, ou “antisocial”. Afinal, qual é a urgência em sair, em curtir, em “aproveitar” a vida? Não posso aproveitar minha vida em minha própria casa? Livre do câncer de pele, da alergia ao pólen, das multas de estacionamento, da ressaca, das bactérias. E no fim das contas não sou só “eu”, sou eu e meus livros, eu e minha televisão, eu e meu computador, eu e meus DVDs, eu e minha cozinha, eu e minha cama, eu e meus pensamentos incontroláveis.
Ficar sozinho em casa não é problema. Problema é ficar preso no trânsito, nas filas quilométricas. Problema é ir em banheiro público, comer algo que você não sabe de onde veio e como foi preparado. Dar entrada gratuita a todos os tipos de germes existentes: isso é problema.
Mas devemos ser sociáveis! Devemos manter contato com as pessoas, ter um milhão de amigos, senão você não é normal, não é feliz. Satisfaço minha cota de sociabilidade usando o telefone, a internet e o correio, muito obrigado.
Todos os dias às seis e meia da manhã levanto da cama, vou ao banheiro, desço as escadas, aqueço uma tijela de leite no microondas, misturo dois tipos de cereal, assisto às notícias enquanto como, tomo um banho, me visto e saio para o trabalho. Enfrento o tráfego, enfrento o chefe, a sala minúscula que ocupo, os colegas mal humorados, as refeições apressadas… todos os dias. Chego em casa, tomo um banho, assisto tv, vou dormir. No fim de semana tudo o que quero é descansar em paz. Telefone toca, não atendo. Alguém bate na porta, finjo que não estou em casa. Tenho sido feliz assim, exatamente assim: estranho e antisocial. No momento não preciso de mais nada. Principalmente de críticas e palpites.
(Ana Elisa)